'Guerra de críticas': técnicos são alvos de ataques nas redes sociais

'Guerra de críticas': técnicos são alvos de ataques nas redes sociais

"Terminou o futebol. Terminou devido às redes sociais", reclamou Renato Gaúcho ao anunciar a sua inesperada saída do Fluminense.

No entanto, para além das estrelas que se destacam em campo, habitualmente mais visadas, a queixa de Renato espelha um desconforto crescente com a pressão digital, que também atinge os treinadores.

O efeito das redes sociais é assunto de discussão no futebol há vários anos.

O sindicato FIFPro (Federação Internacional de Jogadores Profissionais) alerta para os "níveis preocupantes" de "ciberataques" contra atletas, treinadores, árbitros e até adeptos.

Após o Mundial de 2022, no Qatar, a FIFA e o FIFPro exigiram às plataformas ações concretas, depois de um relatório identificar mais de 19 mil publicações de natureza ofensiva, discriminatória ou ameaçadora ao longo do torneio.

A nível regional, a Conmebol implementou em agosto um sistema para detetar mensagens de ódio nos jogos da Taça Libertadores e da Taça Sul-Americana, de modo a alertar as autoridades em situações graves.

"Terminou o futebol. Terminou devido às redes sociais. Tanto para o jogador como para o treinador. Hoje em dia é uma guerra de críticas", afirmou Renato Gaúcho ao demitir-se do Fluminense em setembro, após a eliminação da equipa na Taça Sul-Americana pelo argentino Lanús.

As suas últimas escolhas ao comando do emblema carioca provocaram uma avalanche de ataques nas redes sociais.

"O custo da sobreexposição"

Especialistas sublinham como as críticas públicas deixaram de se restringir aos apupos nos jogos e se tornaram permanentes.

"Antigamente, o treinador era insultado no estádio e isso acabava no dia seguinte; agora, a crítica fica registada, espalha-se em grande escala, influencia a imprensa e afeta os patrocinadores. Este é o custo da sobreexposição digital", explica Ivan Martinho, especialista em marketing desportivo.

"Há sempre quem vá lá escrever disparates nas redes sociais. É uma terra de ninguém, não é?", comentou o treinador do Bahia, Rogério Ceni.

Os treinadores brasileiros enfrentam de forma particular as pressões típicas do futebol, como demonstra o facto de, entre os 20 clubes da primeira divisão, 13 terem trocado de treinador pelo menos uma vez no Brasileirão deste ano. Apenas quatro técnicos se mantêm nos seus clubes há mais de um ano: Ceni, Abel Ferreira (Palmeiras), Filipe Luís (Flamengo) e Léo Condé (Ceará).

Guardiola longe das redes

O treinador do Manchester City, Pep Guardiola, um dos mais conceituados do mundo, confessou que evita as redes sociais.

"Não gosto (...) Nem TikTok, nem Instagram, nada! Só tenho o meu telemóvel e as minhas mensagens", declarou Guardiola no ano passado à Sky Sports.

O impacto crescente das redes sociais obriga treinadores e atletas a "estarem preparados", afirma à AFP o psicólogo desportivo Vítor Guida.

"O treinador precisa de orientação" e "apoio psicológico e da instituição [onde trabalha]" para se sentir "protegido", enfatiza Guida.

Por seu lado, Martinho realça que o uso adequado das redes sociais também cria excelentes oportunidades.

Na era digital, a visibilidade do futebol aumentou de forma exponencial, o que se reflete em melhores salários e acordos de patrocínio, segundo o especialista.

Fora do futebol, figuras como a ginasta norte-americana Simone Biles e a tenista japonesa Naomi Osaka afastaram-se das redes por motivos de "saúde mental".